RADIOLOGIA FORENSE

Urna funerária de criança indígena, que pode ter mais de mil anos, passa por tomografia para pesquisa arqueológica na UFMG

Rafaela Mansur, g1 Minas — Belo Horizonte
14/04/2023
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Artefato foi um dos poucos resgatados em incêndio que atingiu museu da universidade em 2020. A pesquisa é feita pela arqueóloga Gabrielle Ferreira, indígena da etnia Borum-Kren.

Uma estrutura funerária utilizada para o sepultamento de uma criança indígena, que integra o acervo do Museu de História Natural e Jardim Botânico da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), foi submetida a uma tomografia computadorizada no Hospital das Clínicas, em Belo Horizonte, no último sábado (1º). A estimativa de pesquisadores é que o sepultamento tenha sido realizado há 600 a 1.300 anos.

O resultado do exame será analisado em uma pesquisa de mestrado da arqueóloga Gabrielle Ferreira, indígena do povo Borum-Kren, desenvolvida na UFMG. O estudo dos ossos pode contribuir para o conhecimento de aspectos da vida da criança, nomeada pela arqueóloga como Nimu Borum.
 
"Eu montei todo o meu projeto voltado cuidadosamente para esse serzinho. Eu queria muito conversar com essa criança, porque os ossos contam muita coisa [...] Os ossos estão todos pigmentados de vermelho e foram colocados de uma forma que não estão em posição anatômica. Teve um preparo dos nossos ancestrais para colocar essa criança ali com todo cuidado e amor", disse Gabrielle.
A estrutura funerária estudada por ela foi identificada em 2004 no sítio arqueológico Lapa do Caboclo, em Diamantina, no Vale do Jequitinhonha, durante pesquisa do arqueólogo Andrei Isnardis, professor da UFMG.
 
Ela consiste em um estojo cilíndrico, de cerca de 70 centímetros de comprimento e 30 centímetros de largura, feito de casca de árvore. Em uma das extremidades há couro de um animal não identificado, e na outra, palha.
 
A estrutura arqueológica é uma das poucas conservadas após o incêndio ocorrido em 2020 em uma das reservas técnicas do Museu de História Natural e Jardim Botânico da UFMG. As chamas atingiram a maior parte dos sepultamentos humanos provenientes de pesquisas arqueológicas do acervo.
 
Estrutura funerária de criança indígena passa por tomografia no Hospital das Clínicas da UFMG 
Foto: TV UFMG/ Reprodução
 
Segundo Gabrielle, a análise do ossos pode ajudar a descobrir o que Nimu comia, se ela tinha alguma doença, se já sofreu fraturas, a estatura e a idade da criança e até o jeito de andar. A tomografia já indicou que ela era um pouco mais velha do que os pesquisadores pensavam – agora, estima-se que a criança tinha mais de 3 anos e, no máximo, 9.
 

"Às vezes as pessoas esquecem que ossos são pessoas, mas, por se tratar do corpo de uma criança indígena e eu representar também um corpo indígena, por ser uma mulher indígena, não posso deixar que essa criança seja tratada como material arqueológico, e não como uma pessoa. Esse é o ponto-chave da minha pesquisa. Ela é uma pessoa", afirmou Gabrielle.